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Histórias únicas e visões distorcidas: a necessidade de múltiplas narrativas sobre a Amazônia

“- Belém fica no Nordeste, né?” “ – Não, fica na região Norte”.“ – Ah, sim. É que pra mim,  da Bahia pra cima é tudo Nordeste. Sempre esqueço que ainda tem a região Norte no Brasil”. Ouvi o diálogo acima quando, recém-formada em Jornalismo, fui morar em São Paulo para fazer uma especialização na Universidade de São Paulo. E pasmem, eu ouvi de uma colega, do Sul do país, mesma região da jornalista e escritora, Giovana Madalosso, que  há mais uma semana em sua coluna, na Folha de São Paulo, escreveu um texto que mirava na crítica ácida, mas acertava na desinformação, no desconhecimento, no deboche e no desrespeito em relação à nossa cidade.

O desconhecimento em relação à região Norte, ao meu ver, tem relação direta com o que aprendemos na escola promovido pelos livros paradidáticos, em sua maioria produzidos por profissionais da região Sudeste e Sul; e depois encaminhados  para cá. Nesses livros mostram uma Amazônia idílica, onde quase não há vida urbana, uma falsa homogeneidade dos povos indígenas, a vida ribeirinha como sinônimo de escassez e miséria.

 O imaginário que incutiram em nossa mente era de uma educação bancária, cheia de simplificações e reprodução de colonialidades, as quais servem para padronizar e “nivelar” os conhecimentos de toda a população brasileira com uma só visão de mundo – a ocidentalização do saber; o modelo educacional dos Estados Unidos e da Europa. 

Essa obediência por uma história importada “de fora” nos proporcionou a produção de estereótipos pejorativos em relação à Amazônia dentro do território brasileiro. E mais, incentivou o fomento do turismo para fora do país, o que corroborou para que muitos brasileiros conhecessem com mais profundidade Miami, Orlando e Paris do que Belém, Manaus e Macapá, por exemplo. 

Esse tipo de pensamento não surgiu à toa. A intelectualidade e genialidade só podiam se desenvolver nas regiões mais ricas do país, os descendentes dos europeus branquíssimos. E para a parte de cima do mapa, que descendia dos europeus “de segunda classe”, os brancos nem tão brancos assim, como os portugueses e espanhois, só restou produzir mão de obra e enviar para os inteligentes venderem. 

O perigo da história única, parafraseando o livro da nigeriana Chimamanda Adichie, não se desfazem de uma hora para outra, somente com bastante leitura e conhecimento de quem respira, mora e estuda na Amazônia, com seus mais de 60 mil indígenas de 55 etnias somente no Pará, com os  modos de vida dos ribeirinhos que preservam o meio ambiente, com a sabedoria tradicional das erveiras do Ver-o-Peso e com a intelectualidade daqui, que humildemente cito, sabendo que vou deixar muita gente boa de fora, como Otacílio Amaral, Fábio Castro, Edna Castro, o núcleo de Altos Estudos da Amazônia, o NAEA, da Universidade Federal do Pará.

Artigo de Lígia Bernar

Jornalista. Especialista em Mídia, Informação e Cultura pela Universidade de São Paulo (USP), Mestra em Ciências da Comunicação no programa de pós-graduação em Comunicação, Cultura e Amazônia pela Universidade Federal do Pará
(UFPA).

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